- “Claro, querido paciente! Aqui vai”:


Que tal manga picadinha no lugar da paleta mexicana?

Uma mistura com frutas da estação, granola, lascas de coco seco e castanhas trituradas ao invés da barrinha de cereal que está sempre na bolsa para momentos em que a fome aperta?

Salada de frutas com iogurte natural como substitutos da bebida láctea de copinho ?

Torradas com caponata de berinjela ao invés de pão com presunto e maionese ?

Achou sem graça? Querias algo mais elaborado, né?

Mas veja só, eu diria que é prático, colorido e nutritivo. Tudo bem, a caponata não é a receita mais rápida do mundo, mas se você faz uma quantidade boa, ela dura vários dias na geladeira.

Durante anos da minha vida - ninguém acredita nessa história, porque sempre fui relativamente magra (pura generosidade da minha genética), eu comia de maneira desproporcional, exagerada, sem limites... Na época da minha primeira  faculdade, levava vários lanches para aguentar o dia inteiro fora de casa. Só que, quando abria minha lancheira, não descansava enquanto não tivesse terminado tudo. Chegava a comer um pacote de biscoito Maria, daqueles maiores, em poucos minutos.  E era sempre assim: biscoito Maria, bolo, pão de queijo, pé de moleque...

Resultado? Mal-estar constante, sintomas de intestino irritável batendo à porta… e zero sensação de controle.

Por muito tempo foi assim... E o que eu fiz pra quebrar essa ciclo? Descobri que quanto mais elaborada era a preparação, mais difícil era me saciar com uma porção só. Eu queria sempre mais. Então, comecei a mudar a estratégia: deixei de ter certos alimentos em casa e passei a encher a geladeira de frutas, verduras, ovos, castanhas. Quando vinha a vontade louca por doces não tinha nada além de alimentos in natura. Então, a alternativa seria sair de casa pra comprar algo que satisfizesse meu desejo momentâneo ou deixar a vontade passar. 

A preguiça não me deixaria ir ao mercado pra comprar uma barrinha de chocolate, então eu simplesmente encerrava a refeição apenas com o que tinha em casa mesmo. Não foi fácil no início, assim como tudo na vida.

Mas por que é tão difícil trocar a paleta mexicana por uma manga?

A resposta está em nosso paladar condicionado aos superestímulos.

Os alimentos ultraprocessados foram feitos para serem irresistíveis! Açúcar, gordura, sal e cores vibrantes  formam uma combinação que acende áreas do cérebro ligadas à recompensa e a prazer.

É como se cada mordida fosse uma explosão  de sabor para o paladar  e o resultado é que passamos a achar sem graça o sabor natural de uma fruta ou legume.

 

Voltando ao meu relato pessoal, apesar da estratégia que adotei em minha casa, quando sinto vontade de comer algo diferente, eu como sem culpa. Saio com os amigos pra comer pizza, açaí, até cachorro-quente! Mas isso não é algo rotineiro, é esporádico. E tá tudo bem. Porque eu tô no controle agora.

 

A boa notícia: quanto mais a gente insiste em voltar para o simples, mais o paladar se reeduca. Uma manga docinha, um abacaxi gelado, uma castanha crocante... tudo isso vai voltando a ter graça. Mas é preciso tempo, constância e escolhas diárias firmes, porque exige tempo.

Mudar hábitos não é só força de vontade. É também questão de treinar o paladar a mudar a forma como buscamos prazer na comida.

No fim da contas, a pergunta que fica é: Viver refém dos superestímulos ou redescobrir o prazer das coisas simples?

Acredito, como nutricionista, que além de entregar um plano alimentar, a gente precise pensar em formas de viabilizar a adesão à alimentação proposta, seja orientando que a pessoa não faça estoque em casa de alimentos que disparem gatilhos para compulsão, seja sugerindo pequenas alterações, como substituir picolé por uma fruta gelada. Uma coisa de cada vez, sabe. Porque a força de vontade sozinha, às vezes não vai ser suficiente pra eliminar hábitos praticados por anos e anos.


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